21 de dez. de 2011

Esquina





Eu vejo as pernas de louça da moça que passam e eu não posso pegar,
Tô me guardando para quando o carnaval chegar
(Chico Buarque, Quando o Carnaval Chegar)









Talvez o Chico esteja certo, uma hora para tudo e para tudo uma hora. E o carnaval sempre chega, não é mesmo?  Talvez o mundo esteja certo, o Chico está certo, tudo está certo. Mas, eu não preciso/quero está certo. Talvez um tanto de teimosia e outro tanto de cinismo, mas eu não quero está certo. Eles podem até ter razão, mas a razão é só que eles têm. Eu não quero me guardar para nenhum carnaval. O carnaval deve ter lá suas razões. O defeito deve ser meu mesmo, eu admito.

É ruim pegar o caminho oposto, mas é bom, mas é ruim, mas é bom, mas é ruim, mas é bom... Ah é a vida. Enquanto tantos esperam o carnaval chegar, eu prefiro está na esquina e desejar o agora e o amanhã também, amar ontem e depois de ontem também. Amar e desejar são verbos que eu prefiro conjugar em mais de um tempo simultaneamente. Afinal eu não quero a economia do desejo.
E é o amor, por mais piegas que isso seja, que rompe essa economia do desejo. Eu desejo ela ontem, hoje e amanhã, não preciso guardar isso para o quando o carnaval chegar. Talvez isso seja ruim, mas é bom, mas é ruim, mas é a vida.
Tudo isso possa ser um defeito, não necessariamente meu. Mas, eu gosto do efeito desse defeito em efeito dominó. E esse é necessariamente meu. Vocês que se guardem para o carnaval! Que eu vou ficar por ali, naquela esquina entre o Carnaval e Dia de Finados, um bom lugar para olhar o movimento. 







20 de dez. de 2011

Narrativa






O fogo crepita e as histórias foram contadas. Algumas ecoam, reverberam ao longo do tempo e chegam até nós. Quantas e quantas vezes vimos o mito da caverna? Sem percebê-la tal como já fora contada antes, está lá em Platão, em Matrix, no Ensaio sobre a Cegueira, na Cidade das Sombras, em Vida de Inseto...
Existe algum poder nestas narrativas. Estão para além do bem e do mal, não se preocupam com o tempo presente. Camuflam-se, entram clandestinas em outras narrativas, ocupam espaços que não deveriam ser seus. Deve ser alguma força que nossos olhos perecíveis não conseguem captar e por isso não podemos guerrear com elas.
Porém, já não precisamos deixar que estas narrativas determine o seus sentidos. O mito da caverna hoje não se trata mais de uma busca da verdade. É preciso pensar em outros sentidos, em outros caminhos.
Criamos o mundo nestas narrativas, traçamos cartografias, inventamos espaços e fronteiras. Por isso que não podemos deixar que as mesmas narrativas criem o nosso mundo. É preciso assumir as redás.
Que ergamos paliçadas, que as defesas sejam preparadas, a risca foi traçada e eles não passarão.

15 de dez. de 2011

Da força da fragilidade





Das maiores fragilidades que os homens têm, o coração me parece posto em lugares inadequados. Tido como frágil, pois pode ser partido com palavras igualmente frágeis. Mas, que bombear sangue para o resto do corpo sessenta vezes por minuto, durante toda uma vida.
Talvez o coração possa ser frágil. Mas, isso não exclui a força deste músculo que mesmo partido, não para, pulsa e doe, pulsa e se alegra, pulsa... Pulsa mais e mais.
Talvez as nossas vidas sejam toda essa fragilidade, uma fragilidade de pequenas coisas grandes. Sorrisos, olhares e toques. Tudo tão frágil, mas tudo necessário. No fim, estamos o tempo todo neste relampejar de coisas frágeis e fugidias. Em encontros que não podemos delimitar os quais reais são. São segredos velados que se contados os outros nem acreditariam. Um mundo de verdades, todas elas igualmente frágeis.
As nossas fragilidades nos leva para o andar na corda bamba e é justamente isso que nos força ao equilíbrio. Então, que nossos corações se encham de coisas frágeis e miúdas, frágeis e enormes. De todos os sorrisos, olhares e toques.


9 de dez. de 2011

Contradições


“Cante mais uma vez comigo
Nosso estranho dueto
A beleza da sua voz
E a força da minha dor”
(Fantasma da Ópera)

Uma cantora lírica, voz sua suave, técnica, perfeita. Um cantor de rock, vigoroso, ousado, emoção mais que técnica. Um musical clássico, popular, conhecido por todos. Desta vez subvertida, por arranjos pesados de guitarras distorcidas, marcado por uma linha de baixo e uma bateria encorpada, apenas alguns toques de teclado para não esquecermos que se trata do Fantasma da Ópera.
Tudo um tanto inusitado, aos olhos que de longe vêem, tudo fazendo sentido para que acompanha de perto. O dueto da força e da beleza, talvez poucas vezes fez tanto sentido.
Quantas e quantas vezes vamos ter nos surpreender com as diferenças que somam para construir o belo? A beleza do outro está justamente em ser o outro. A oposição, a contradição são invenções e não inventos. Criamos todos esses lugares. Mas, para que eles nos servem?
Caminhos que partem direção opostas, mas que se encontram. Afinal o mundo é redondo. Encontros ao acaso entre forças diferentes. Dor e beleza, força e delicadeza. Caminhos que se somam.
A lógica não é dada a priori , assim como a beleza destes encontros inusitados. Acasos que seguem, na busca de caminhos alternativos.


5 de dez. de 2011

Entre sonhos e amores perdidos




Ela, uma raposa, astuta e ardilosa e magíca e inventiva. Ele, um moge, calmo e gentil e obstinado. Uma aposta. A raposa deveria fazer o monge abandonar o monasterio, onde era o único morador. No topo de uma colina, onde o resto do mundo era apenas um sonho distante. Onde os sonhos não carecianham de interpretações, eles estavam lado a lado dos demais seres.
Mas, a raposa não pode vencer a aposta, ninguém poderia. Ela desiste mesmo de tentar. Ainda mais agora que a raposa não queria está em outro lugar. E este lugar é o monge. Ela o ama, mesmo que as diferenças sejam tantas, mesmo que este amor seja impossivel, ela o ama. Talvez ela não goste de amá-lo. Talvez ele nem mesmo possa saber deste amor. O amor deles é tantos talvez que mesmo a mente mais inventiva não poderia estabelecer uma cartografia. Não existe um espaço seguro a raposa. Ela é sempre vim a ser. Um devir de coisas muidas que só existem no sonho de quem observa o monge e a raposa.
As apostas do passado já não importam. Em algum momento elas foram o acaso do encontro, mas agora, só existe o agora. O passado está tão distante quanto o sonho que precisa ser narrado para ter sentido.
O monge está em perigo. Sua alma vale um prêmio para um mago nas trevas. E é inevetival a morte do monge, a raposa sabe disso. Mas, ela não aceita. Não pode aceitar! Não! Não mesmo. Ela está desesperada. Ela corre pela noite, rasteija pelas sombras, mergulha nas memórias, vai ter com o próprio sonhar para impedir a morte de monge.
O sonho lhe diz que ela precisa capturar o sonhar do monge. É preciso se agarrar ao impossivel. E ela o faz, faz mesmo que custe a sua própria vida. O monge está salvo e no outro dia nem saberá do que aconteceu, não sabe quão real é o sonho.
Os amores e os sonhos não estão tão distantes. Quantos amores passados são como sonhos que só existem com o acordar? Que precisam ser narrados para existirem, talvez toda história seja esse recontar o sonhar. Talvez, não saibamos de todos os amores perdidos, pois, talvez não exista amor perdido. O passado enquanto sonho e os amores quanto acaso. A raposa e o monge são amores que não se realizam, mas, que brilham por conta das possibilidades não construidas. De tudo que ainda não foi, mas que pode ser narrado. Inventado, sonhado e amado por todos nós que aqui estamos.


29 de nov. de 2011

Desejo


O vento sopra e por causa disto as asas do anjo impendem que ele pare. O progresso é inevitável. Mas, ele gostaria de conseguir parar o tempo e por isso seu desespero. Ele quer... Apenas quer, por instante que fosse gostaria de subjugar o mundo ao seu desejo.
Ele gostaria de impedir o passado. Gostaria de ter sido mais educado com aquele desconhecido. Gostaria de ter sido mais sincero com as pessoas que ama. Gostaria de impedi-la, pediria que não fosse com ele, ele teria gostado até mesmo de só pedir, mesmo que a resposta fosse não. Gostaria que a tivesse conhecido antes do próprio tempo existir, naquele instante que o sonho e presente são feitos dos mesmos sorrisos. O anjo andaria com suas asas fechadas para não ser preso e escravizado pelo o vento do progresso. Tantos desejos... Desejos.
O passado vai se acumulando as costas. Ele só pode olhar e desejar parar o passado. E ele deseja isso ao ponto de arriscar tudo. Talvez, ele não arrisque, talvez apenas deseje. Mas, bastaria apenas uma centelha de esperança, apenas uma centelha para que anjo corte as suas asas.
Ele cairia provavelmente longe de tudo aquilo que tanto deseja. Cairia e talvez nem mesmo sobrevivesse, talvez... São escolhas que o desejo lhe impele fazer. E o reinado do desejo é imperativo e cruel.
Estamos sempre entre as balanças do desejar e do realizar. Fazemos nossos corações de cárcere do desejo, quando não fazemos do desejo o carcereiro. Talvez, devemos tomá-lo como conselheiro. Escutar-lo. Precisamos confabular com o desejo as revoluções. Tomá-lo como amigo.
Assim, o sofrimento da queda do anjo será aliviado pelas palavras doces do desejo. O desejo não pode nos imperar, mas talvez possamos de fazer-lo de amigo, de irmão e irmã.
O anjo da história não consegue parar o vento do progresso, talvez ninguém consiga. Porém, talvez ele possa corta a sua asa e enganar o jogo. Isso seria a revolução que faria explodir o continuo do tempo e realizar o seu desejo.
Mas, talvez ele tenha medo da queda e sempre ponha a culpa de sua covardia no vento que sopra do paraíso. A queda pode ser dolorosa,  mas será melhor do que nunca ter arriscado colocar seu pé no chão.

28 de nov. de 2011

Dos amores perdidos




Naquele instante Romeu não saberia mais viver, Julieta fria e falecida aos seus olhos. Então ele se mata e ela acorda. Também se mata. Talvez o maior casal já criado na literatura.
Mas, a grandeza não é morrer de amor. O amor não é simples assim. A grandeza deste casal é ter encontrado alguém que morra pelo o outro. Romeu não morre pelo amor, ele morre por ter perdido alguém que morreria por ele.
O amor deles não era nada civilizado. Não tinha recibos de motéis, nem família no sofá em um dia de domingo. Quando juntos não viajavam ao passado, nem faziam planos para o futuro. Nem presentes de namorados. Era só o amor que já não buscava nada, apenas o olhar do outro, mesmo que para isso o mundo fosse desafiado numa cena de balcão.
Ele e ela encontraram o que quase todos buscam. Alguém que seja capaz, do fundo de nossos covardes corações, de morrer de amor em nosso lugar. Mas, isto nos coloca em uma armadilha, pois, um “amor assim quando não morre mata e amores que matam não são de morrer” (Joaquin Sabina). Então, eles morrem.
Ao morrer eles nos oferecem seu coração. E selam a paz quando tudo estava perdido. Acabaram por criar um amor depois do amor.

8 de nov. de 2011

Esperança




O futuro é uma ameaça, ele muda o presente constantemente. Suas configurações não são claras, os fios que o tecem não são visíveis. E as distopias estão sempre a espera. Em Filhos da Esperança o futuro é sombrio. Distópico.
            A humanidade é incapaz de procriar há 18 anos. Um mundo sem crianças. O desespero agrava os problemas, guerra, xenofobia, solidão, consumismo, apatia... É um fim do mundo calmo e silencioso. Nada de explosões nucleares, desertos e gangues de motos. Mas, assusta.
            Uma mulher engravida. Negra, imigrante e solteira. A esperança volta ao mundo. A esperança então é caçada, pois ter esperança neste mundo tão próximo ao nosso é ter um poder inacreditável. A criança é buscada. Ritmo frenético, afinal é um filme de ação.
            Em momento de calmaria o herói e a grávida conversam. Quem é o pai dessa criança? E ela responde que é virgem. Depois vêm os risos. E eu assistindo maravilhado. Quando ela diz que não poderia saber quem é o pai, pois vários homens passaram pela sua cama.
            Em um dialogo em meio a tantas cenas de tiros e perseguições, eles matam deus e sua ética. Pois, foi ela que nos levou ao fim do mundo. Agora, nossa criança messiânica é filha do prazer, é filha da renegada, é filha do que queríamos esconder. Messias demasiadamente humano.
            Subverter a ordem é o papel do messias. Pois é a ordem que nos ameaça. Ela sinaliza um momento de perigo. E assim podemos pensar que podemos ser melhores se deixarmos de tentar ser tão bons.  


7 de nov. de 2011

Astucias





Penélope espera Ulisses. A mesa de sua casa é lugar de disputas e ela não pode fazer nada. É a tradição. A mão dela é a coroa de Itaca e eles sabem disso, eles querem isso. Mas, ela espera Ulisses. Já se foram dez anos.
De alguma forma ela sabe que Ulisses retornara. Fé é o motor de sua espera e ela espera. Mas, a tradição vem cobrar o seu preço e ela precisa escolher para desposar um entre tantos candidatos, porém ela não deseja nenhum deles. É a tradição que manda.
Então a inventividade dela vem à tona. A astucia de Penélope lhe salva. O acordo entre ela e os seus pretendentes é escolher um depois de tecer um tapete. Ela tece o tapete todos os dias. Dia após dia. Eles esperam ela terminar. Dia após dia eles esperam.
Mas, as astucias de Penélope se revela. Ela tece de dia, mas a noite destrói seu trabalho. Noite após noite. Ela ganha tempo para esperar Ulisses.
Precisamos aprender as astucias de Penélope. Precisamos nos criar, mas precisamos mais ainda nos destruir. Nossa salvação está na destruição de quem somos para podermos nos criar, recriar. E é preciso que nossas identidades sejam criadas de formas mais inventivas e que sejam destruídas de formas mais inventivas. É preciso que possamos quebrar nossas regras, nossos acordos. Assim como Penélope. No final novamente nos salvamos de formas impensáveis.


24 de out. de 2011

Narrar para sobreviver




Então Scheherazade inspirou profundamente e começou a contar suas histórias. Ela inventa Aladin e assim ganha mais alguns dias de vida, ela sabe que quando a história terminar o Sultão lhe cortará a cabeça. Mas, ela termina mesmo assim. Os contos sempre precisam ser finalizados. Rapidamente ela inventa um conto novo, antes que o Sultão percebesse estava envolto na história de Ali Babá. Ela diz: Abra-te Sésamo e sorri, sabe que ganhou mais algumas noites de vida.
Ela não sabe onde ficam as histórias antes de serem contadas, mas ela sabe que quarenta ladrões soam melhor que trinta e nove ou quarenta e um. Com isso está salva até conseguir contar uma nova história.
Assim devemos pensar o oficio do historiador. Precisamos contar histórias novas o tempo todo, pois só assim podemos garantir a nossa sobrevivência. Nossas cabeças estão sempre a premio, mas no fio da navalha é que temos, assim como Scheherazade, ser ainda mais inventivos. Precisamos criar Ali Babá, Aladin e Simbad. Precisamos dos gênios, do tapete e da lâmpada mágica. Precisamos de fantasias e aventuras. Pois, é destes truques de inventividades que vivem os historiadores.
E tal como Sheherazade precisamos vencer a morte narrando histórias. E de fato no final nos salvamos de formas impensáveis.


12 de set. de 2011

As Sombras da Torre Ausente





Dez anos atrás um pequeno grupo de homens levaram medo a uma nação de milhões de pessoas. Seu líder foi o rosto que estetizou todo o medo, Osama Bin Laden para o bem e para o mal mostrou o que alguns homens eram capazes de fazer. Desde de então estamos sob as sombra das torres ausentes.
Isto modificou os rumos dos heróis, pois, a jornada agora já não poderia ser a mesma. As sombras das torres ausentes deixaram sua marcas nas produções artísticas americanas, nas HQs não seria diferente.
O Coringa no Cavaleiro das trevas, assim como Bin Laden, foi capaz de levar o medo aos corações. Seus atos, tinham o mesmo objetivo, atingiram uma escala que ainda não tinha sido vista. Mesmo o Coringa da Piada Mortal que foi capaz de aleijar e depois violentar a Batgirl, não foi capaz de fazer isso em um nível de terror que assombrasse toda uma cidade. O Coringa do Cavaleiro das Trevas é Bin Laden. O signos que este Coringa emite só são compreendidos por conta das ações de Bin Laden.
O Batman do Cavaleiro das Trevas, por sua vez, é o espírito do povo americano capaz de se vender, de cair, de corromper para por a suas mãos no Coringa. Não é a toa que o Batman no final do filme rompe o direito a privacidade e grampeia os telefones de todos na cidade, o direito a privacidade e sigilo de suas correspondências foi uma das primeiras concessões que o povo americano fez em prol da segurança, assim como o Batman fez primeiro para conseguir deter o Coringa.
A redenção no filme está na destruição da maquina que viola os direitos dos cidadãos de Gothan, assim que o Coringa é derrotado. Mas, isso é apenas uma catarse as torres ainda faz sombra, o inimigo foi morto, mas o medo está vivo. O medo habita em cada comemorativa, em cada esquina, do Superball até a Time Square, em cada compra, em cada venda, sempre o medo está lá.


2 de set. de 2011

Memórias negociadas



Muito comum nas histórias em quadrinhos o passado ser constantemente revisto, recontar a origens se tornou um lugar comum. Trair o que foi feito antes é de fundamental importância para que os heróis possam habitar o agora. Porém, é preciso que essas histórias que recontam as origens sejam ao mesmo tempo próxima e distante de suas originais. Super-Homem sempre precisará ser o alienígena, Batman precisa de sua tragédia familiar. Mas, ao recontar estas histórias é preciso trazer as características dos heróis para o presente.
Este é processo complexo, pois, é necessário que se negocie com a memória, com o silencio. Em Lanterna Verde: Origem Secreta, esta negociação é feita página a página. O caminho do herói percorrido pelo Lanterna nesta nova origem transformou a coragem em seu maior defeito e melhor qualidade ao mesmo tempo, pois o público hoje exige heróis esféricos, que apresentem defeitos. Porém, quando este foram criados eram perfeitos. E os leitores ainda os querem como heróis.
Esta questão mostra que mesmo sem dizer a lógica cartesiana não é capaz de nos explicar, nos traduzir. Queremos heróis perfeitos e que estes errem, que tenham problemas pessoais assim como nós, mas que ainda assim sejam heróis de feitos maravilhosos.
E para tanto é necessário um constante negociar com a memória, onde o silêncio e os ruídos fazem as mudanças não soarem dissonantes. Onde o novo que conta o que já velho, já é sabido, tenha sentido e emitam significados.
A História também, ensina que as lutas pela memória estão sempre presente no campo político. O partido no poder sempre vai querer tomar para as políticas de estado, assim trazendo para sua mão a condução da história. Ou na medida que os personagens políticos se transformam na sua trajetória, como ao fim da ditadura onde aqueles que foram derrotados voltam como vitoriosos na e pela memória. Neste caso, eles assumem como vitoriosos pois conseguiram negociar para si a imagem de defensor da democracia, mesmo que durante a ditadura estes lutassem para instalar uma outra (a do proletariado) mas, não a democracia de fato.
O passado não está morto, por conta deste constante negociar.



13 de jun. de 2011

Mapas das Escolhas





Então ela olhou para mim de forma desinteressada. Tinha uma maquiagem forte nos olhos e usava uma boina que fazia sombra no olhar. Seu cabelo saia dessa boina em uma trança de um lado e do outro lado uma franja. Devia ser mais jovem que eu uns cinco anos. Enquanto eu olhei para ela, não  vi expressão nenhuma, deve ser pelo seu jeito blazer, mas isso lhe conferia charme que era completado com sua estilosa roupa.
Por um instante eu consigo pensar em vários acasos. Se por acaso eu tivesse esses cincos anos a menos eu poderia sorrir para ela e puxar conversa. Se acaso eu estivesse com uma roupa menos sóbria, ela poderia ter olhado para mim. Tantos acasos... Depois pensei no ultimo acaso. E se antes desse encontro de olhares eu não tivesse encontrado a mulher da minha vida.
Mas, o acaso de encontrar uma pessoa não determina o amor. São as escolhas, a construção entre pessoas. Podemos nos encontrar por acasos, mas o acaso não determina nossas vidas.
E no exato momento eu fiz o acaso se subjugar a minha vontade, escolhi mais uma vez a mulher que eu amo. E mais uma vez acabo voltando para casa com ares de bobo (qual seria a graça de se apaixonar se não ficássemos assim).
Então podemos pensar em vários encontros ao acaso que não se transformam em mais nada, não pelo acaso em si, mas por nossas escolhas. Quantos amores não realizados já povoaram nossas produções culturais. Wolverine e Fênix, Seya e Atenas, 007 e secretaria do MI6... Todos acasos que as escolhas fazem ser apenas possibilidades distantes. 
Mas, conseguir olhar para outras possibilidades é parte do caráter épico do amor, que me faz sempre escolher “ela”, sempre “ela” que se construiu a mulher da minha vida. 


12 de jun. de 2011

Mapas do acaso



Algumas obras no mundo dos heróis se voltam para contar as origens, voltam para reformular o que já foi contado, pois, tudo que é passado é narrado no presente. Toda história produzida é produzida no e pelo presente uma vez que o passado em si não tem significados. Quem significa o passado são os homens do presente, o significado é construindo apenas a posterior dos acontecimentos.
Por isso é fácil na reconstrução histórica perdemos a dimensão do acaso. Em X-men First Class os encontros, os desencontros são frutos do acaso. Não o acaso do jogo de dados, mas os acaso da lutas. Ao enfrentar um inimigo, Charles Xavier acaba encontrando Magneto e desse encontro explosivo nascem os X-mens e nasce a amizade mais bem elaborada das Hqs da Marvel.
Quantos acasos vivemos no cotidiano que acabamos por vê-los como algo dado a priori. Entender isso é aceitar a complexidade histórica da operação historiográfica.
O acaso esta presente até mesmo nesse exato momento, pois de todas configurações possíveis de mundo, de todas as pessoas, nacionalidades, de possibilidades, de línguas... Você está nesse exato momento lendo este texto. Pense quantos acasos lhe trouxe até aqui. 

7 de jun. de 2011

Do nascimento das coisas





A história me ensinou a rir das solenidades de nascimentos das coisas, dos movimentos, pois estes se esquecem de que é a disputa, o deparaste e o que não é o puro que dão origem das construções na história. Em X-men first class podemos observar a impureza da formação da equipe, o que poderia ser fruto do sonho de (co) existência pacífica entre humanos e mutantes, não o é. A equipe é formada na tensão entre mutantes e governos, mutantes contra humanos, Estados Unidos e URSS, mutantes contra mutantes, e mais ainda entre a tensão Magneto e Xavier.
A história, também, é bélica. Marx sabia disso, era a luta de classe que movia a sua história, mas já não posso mais acreditar em classes tal com Marx, mas a luta é inegável. Assim como Marx X-men foi movido pela luta. É na luta que podemos entender que a história não nós é dada, ela é construída.
O acaso das forças, dos encontros entre Xavier e Magnetos e os demais personagens é o que torna o resultado das disputas na e da história indetermináveis. Pensar como essa adaptação foi pensada é o desafio historiográfico que não podemos nos negar.



27 de mai. de 2011

Soprando No Vento (Bob Dylan)


Quantas estradas precisará um homem andar

Antes que possam chamá-lo de um homem?

Quantos mares precisará uma pomba branca sobrevoar,

Antes que ela possa dormir na areia?

Sim e quantas vezes precisará balas de canhão voar,

Até serem para sempre abandonadas?

A resposta, meu amigo, está soprando no vento

A resposta está soprando no vento

Sim e quantos anos pode existir uma montanha

Antes que ela seja lavada pelo mar?

Sim e quantos anos podem algumas pessoas existir,

Até que sejam permitidas a serem livres?

Sim e quantas vezes pode um homem virar sua cabeça,

E fingir que ele simplesmente não vê?

A resposta, meu amigo, está soprando no vento

A resposta está soprando no vento

Sim e quantas vezes precisará um homem olhar para cima

Antes que ele possa ver o céu?

Sim e quantas orelhas precisará ter um homem,

Antes que ele possa ouvir as pessoas chorar?

Sim e quantas mortes ele causará até ele saber

Que muitas pessoas morreram?

A resposta, meu amigo, está soprando no vento

A resposta está soprando no vento

Da História






A esperança dorme com o historiador, pois, este sonha o mesmo sonho daqueles que estão no passado, confabula a mesma conspiração, participa da mesma sociedade secreta, bebe a mesma bebida na mesma taberna, olha as mesmas estrelas... E esses sonhos, essas conspirações, essa sociedade secreta, essa bebida, essa taberna e essas estrelas têm o nome de felicidade.

Se?





"O que aconteceria se?" é um título que Marvel comics usa volta e meia para mostrar outras possibilidades para histórias já contadas, de encontros e confrontos que não aconteceram... Mas, isto explora uma característica muito comum das novas vidas.

Quantas vezes gostaríamos de voltar no tempo só para ver o que aconteceria se tivéssemos tomados outras decisões, outros caminhos... Quantas mulheres amaríamos? Quantos sorrisos daríamos? Quem seriamos neste exato momento?

E a culpa deste sentimento é a liberdade, a mais bela das maldições. Ela é a causa desta angustia, a culpada de pensamos: "E se?

Não que nossas escolhas sejam definitivas, longe disso. Mas, os nossos caminhos seriam outros mesmo voltando por veredas já trilhadas, vendo as paisagens já vistas, não seriamos mais os mesmo que antes.

A História é a construção das possibilidades, mas, pensar no " e se?" pode nos ajudar a entender os caminhos trilhados, pensar se realmente queremos trilhas estes caminhos, se valeu a pena esse caminho... Ou até mesmo pensar se trilhamos "bem" estes caminhos.

17 de mai. de 2011

Das Divindades

Os deuses existem na medida em que os homens os criam. No mais recente filme da Marvel, Thor, esta é a receita que transforma Thor em Deus. Ele só é visto como Deus pelos humanos, em Asgard ele é apenas o herdeiro inconseqüente do trono, por mais forte e valoroso que este seja em batalha.

Qual seria a razão de necessitássemos tanto de Deuses? Em tempos remotos precisávamos deles para negociar com a natureza, mas, agora qual é sua razão de realmente existir?

Conforto? Esperança? Encontramos isso nas nossas relações O outro é capaz de assumir estas responsabilidades. Então se temos de deusificar algo que seja o outro.

Mesmo o poderoso Thor, deus entre os homens, apenas supriu suas faltas diante do Outro. Diante do amor por uma mortal seu modo de ser rende a coração do homem. Uma mulher foi capaz de transformar Thor em guerreiro digno de seu trono, o amor é conquista do fogo até mesmo se este fogo fosse o dos deuses.

Nessa conquista do fogo o amor é Prometeu, é aquilo que se deve adorar, é o Deus que vale a pena e é o Deus libertador.

15 de mai. de 2011

História Frágil




Os discos voadores chegaram e nesse mesmo dia os mortos voltariam a vida, poucos minutos depois os deuses entrariam em guerra, antes que essa guerra acabasse os animais contariam histórias ao homens, ao mesmo tempo as montanhas se cansariam de suas posições e virariam, antes delas completarem os movimento, os computadores se revoltariam e as telas diriam o que deveríamos fazer. Mas, eu nem ficaria sabendo, pois estava no meu quarto, sem fazer nada, só esperando ela ligar[1]

A história que vivemos não é necessariamente a dos grandes movimentos, assim como o disco voador não foi visto, talvez não tivemos medo do comunismo, da bomba nucelar ou dos ditadores latinos americanos. Vivemos com os sorrisos, com as lagrimas de quem nos é próximo e com quem para o bem ou para mal nos importa. A História só existe, então, no encontro ou no desencontro.



[1] Adaptado do poema “Quando os discos voadores chegaram” de Neil Gaiman no livro: Coisas Frágeis 2

27 de mar. de 2011

Vereda

Vivemos sob signos que nós impelem a determinadas formas de felecidades, aceitamos tal como eles se apresentam por força do concenso. Negamos sua armadilhas, somos complacentes, não atinamos os perigos, negamos a nossa própria astúcia. O concenso é o perigo, é o relampejar de um momento de perigo. É uma auto-negação, é desperdiçar a si mesmo.

Esses signos do concenso acabam por determinar o sentido de nossas experiências. Acabam por dizer que vivemos em etapas, que devemos viver em etapas, que é impossível viver sem etapas. Cada momento já tem seus significados pré-estabelecidos, acabar a universidade é uma vitória, amadurecer é ser bem comportado.... Enfim, ver este filme se torna muito tedioso, uma vez que o final é revelado no começo da narrativa por todos os outros espectadores.

Fugir disto é a vilania, é o ato das sombras. A vida a contrapelo é fuga destes signos pré-moldados as nossas experiências. O caminho do herói é o conformismo, precisamos pensar em trilhar o caminho dos vilões, o caminho da experimentação, é preciso passar de um para o outro. O caminho é o que interessa, assim como o equilibrista que não cai da corda bamba por está em movimento. O movimento é fundamental para estar e não ser, para negar ao concenso o controle de nossas cartografias.

Por isso o vilão e o herói precisam intercambiar os caminhos. Por isso nós precisamos ser o caminho.